26 de março de 2012
servos da terra

IMG_7915Simplesmente

Pe. Airton Freire

(Texto do Livro “A Vida Simples”)

Simplesmente beber, gole a gole, um poço dágua. Simplesmente olhar a chuva correr pelo chão, pela calçada. Simplesmente viver os dias, sem trocá-los pelas madrugadas.

Simplesmente olhar um rosto e pronunciar seu nome. Caminhar ao lado do outro, simplesmente, silenciosamente.

Alimentar o corpo, a alma e a mente com o que eles necessitam, por alimento, diariamente. Dá a todos eles labor e repouso no tempo devido. Não avançar, nem deixar etapas não concluídas atrás, de sorte que, no final, possam se preservar saúde e paz.

Agasalha teu corpo como as aves agasalham-se em seus ninhos. Tem por ele respeito e carinho. Mantém tua alma serena, mesmo na tormenta. Não deixes de dar-lhe o alimento de que necessita. Se preservada, ela te preservará nas desditas. Que vãs preocupações não ocupem teus pensamentos. Vive cada momento. És parte da criação. Não foste criado para gerar nem para viver tensões, mas para criar laços de fraternidade, fundados na justiça das relações humanas e na verdade, isso que traz paz ao coração.

Evita tanto o acúmulo quanto a dissipação. Não aceites nem causes a ninguém constrangimentos. Dissipa todo e qualquer ressentimento. Afasta-te da ilusão. Preserva corpo, alma e mente de qualquer ostentação. Não dês ao teu sim a aparência de não, mas vive, coerentemente, na alegria de tua opção.

Trata teu corpo, tua alma e tua mente de forma digna. Eles já têm seu próprio valor. Seu valor é sua riqueza. Se tratados, terão sua própria beleza; o que não lhes diz respeito, não lhes queiras sobrepor.

Vive a vida com alegria. Não sejas melancólico, como aqueles que se apegam ao fim de cada dia. Fortalece o teu élan. Sê como o sol que se levanta a cada manhã. Espanta de ti a preguiça, a cobiça ou qualquer outro mal, que fira a tua alma, entorpeça a tua mente, golpeie teu corpo afinal.

Não exijas de ti mais do que aquilo que possas dar. Se vieres a errar, a cometer equívocos, sejas tu o primeiro a te perdoar.

Vive com simplicidade, na gratuidade, com liberdade. Sê prevenido, não armado, para toda e qualquer eventualidade. Na falta, faze a confissão. Defende o perdão. Vive a autenticidade. Não desdenhes a criatividade. Cultiva  a hospitalidade. Nada em ti se assemelha a vulgaridade; antes, haja em ti e aja contigo, com intensa atividade, a singularidade.

Não defendas para ti o sofrimento. Mas, se ele te ocorrer, aceita-o, sobretudo se te vier em decorrência de tua vida conseqüente. Nada faças por fingimento. Disso não faças uso nem por um momento; pois, ele vicia a alma e não a preserva de constrangimentos.

Vive a vida simplesmente. A vida simples. Naturalmente.


21 de março de 2012
servos da terra

12 (2)

Meditações Quaresmais

Pe. Airton Freire

 

Uma explicitação da Salvação:

Uma explicitação da salvação precisa ser pragmática e compreensível, pois a fé vem pelo ouvir. Más como pode alguém crer naquilo que não entende? Uma soteriologia ( explicitação da salvação) mínima deve conter pelo menos o seguinte: O pecado cria alienação (cisão) entre Deus e o homem. A intervenção de Deus, através de Jesus, aponta o caminho para Deus e convida o homem a uma de-cisão.

Uma questão inicial há de ser colocada:

Não de agora, mas desde os primórdios do cristianismo, uma questão ocupa uma posição central no pensamento teológico do Ocidente, sobretudo, a saber,  a morte de Jesus, na cruz, como sacrifício expiatório pelos pecados da humanidade. A forma exclusiva como este fato é colocado e que problematiza sua compreensão que, antes de qualquer interpretação, há de ser contextualizada.

A realidade dos sacrifícios, em vigor entre os hebreus desde os tempos da Abraão (20 séculos antes de Cristo), terminou após a queda de Jerusalém por Tito, general romano, no ano 70 da era cristã. Nesse contexto de sacrifícios de expiação teve lugar o acontecimento Jesus de Nazaré, cuja vida, morte e ressurreição foram objeto de estudos, dentre outras coisas, ao longo dos séculos que se sucederam.

No que concerne a Cristo Jesus, apresenta-se Deus Pai com desejo de reparação pela ofensa cometida pela humanidade contra sua soberania e escolhe ele seu Filho  para lhe oferecer um sacrifício cruento como condição para que ele, o Pai,  a parte ofendida, conceda o perdão, “ fazendo recair sobre ele o peso se nossas faltas”, citando, textualmente, Isaias 53, 4-6, que diz: Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. Mas, ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moído por causa das nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados”.

Na interpretação literal desta passagem, somada a outras, concluiu-se que Deus desejava e planejou a salvação da humanidade mediante a transferência de um castigo que pesava sobre todos os mortais para o Filho, tornando-se ele, por esse procedimento, o Senhor e Salvador.

Con-textual-izando o fato:

A recusa do plano de Deus, que contempla o amor, o perdão, a paz, a justiça e outros valores de que necessitamos todos e cada um nós, seres humanos, para vivermos a “vida plenamente”, é fato registrado na história de todos os povos, em todos os tempos. Portanto, a inaceitação de um plano de amor é universal e, nessa condição, patente é a necessidade de “voltar à razão primordial de ter sido criada a Humidade. Historicamente, tal recusa deu-se nos tempos de Jesus de maneira explícita atingiu a vida de um povo e todos os povos.

Segundo São João, os lideres religiosos judeus de seu tempo representam, de modo paradigmático, a recusa de toda humanidade a Deus. A oferta gratuita de Deus, em seu Filho foi rejeitada (Jo 1,10s; 7,7;At 4,26s). As “trevas” recusaram a “Luz”, cuja culminância aconteceu na rejeição a Cristo Jesus (Jo 1,5; 3,19; Lc 22,53).

Toda a vida de Cristo foi uma entrega ao Pai. A sua fidelidade, única em toda a história da humanidade, revelada em sua vida e em seu modo único, igualmente, de referenciar-se ao Pai, revelaram-no sendo mais do que o que do Messias se esperava e da missão que realizava. Estava em pauta o advento do “ Reino de Deus” “no meio de nós” (Lc 9,2; 11,20; 22,18; Mc 9,1; Jo 1, 26; Jo 7, 28). Como tal recusa foi por Deus “administrada”? Com a doação incondicional e ilimitada do Filho. “ Tendo amado os seus que estavam no mundo, ao extremo ele os amou” (Jo 13,1), acontecimento de toda uma vida, localizado no evangelho de Joao na época da Páscoa. Digo-lhes que com cruz nós fomos assim como, sem cruz, em Cristo seríamos salvos. Ele e não a cruz é que nos salva. Pois, ele não veio ao mundo para fazer um sacrifício, que não eram do agrado de Deus, mas para fazer a vontade do Pai (cf. He 10, 9) e a vontade do Pai “ é que não se perca nenhum daqueles que o Filho lhe deu” ( Jo 6,39).

Então, vem a pergunta: a morte de Jesus foi uma ação humana, resultado de uma recusa a  sua pessoa, à sua mensagem ou uma ação de Deus?

Quando lemos “O Deus de nossos pais ressuscitou Jesus a quem vós matastes, crucificando-o no madeiro” (Atos 5,30) entendemos que foi uma ação dos seres humanos que “ se coligaram, em comum acordo, contra o Senhor e seu Ungido” ( At 4,26). Fizeram-no para que fosse eliminado de seu meio aquele que tinha se tornado motivo de “ queda e soerguimento de muitos em Israel” (Lc 2,34) Negaram-se, negando-o, numa ação de desconhecimento da própria gravidade do ato que realizavam, “não sabendo o que faziam” (Lc 23,34), condenando-o como “um criminoso” (Lc 22,37). Assim entendido, a morte de Jesus foi uma ação eminentemente humana contra Deus, dos que se fecharam a Ele.

Na verdade, os acontecimentos da sexta-feira, daquele 14 de Nisan, foi algo tão difícil de entender que, somente aos poucos, os discípulos começaram a compreender que “convinha que o Messias sofresse todas essas coisas para entrar na sua glória”(Lc 24,26), pois, antes, esperavam “ que fosse ele o que remisse Israel ”(idem) e entendiam ter sido obra dos “ principais dos sacerdotes”  e de “ príncipes que  o entregaram à condenação de morte, e o crucificaram (Lc 24,20). A partir de Jesus, à luz da Ressurreição, eles entenderam que Deus transformou o crime dos seres humanos em seu contrário. A cruz tornava-se, a partir da Ressurreição, não mais expressão da negação a Deus e ao seu eleito, mas tornara-se o “sim” ilimitado de Deus pela humanidade. Em razão disso, inicia-se a busca de compreender o lugar da cruz no plano salvívico de Deus. Como poderia Deus transformar um ato de rejeição num sinal de revelação de quanto ele ama o mundo “de tal maneira, que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16) Ainda aqui, perceba-se, a finalidade de vir o Filho ao mundo foi a de não o fazer perecer, mesmo que tendo vindo para os seus, estes “ não o tenham acolhido” (Jo 1,11). Antes, antes, sinal de castigo (romano) contra malfeitores, tornou-se o sinal visível de que Deus que, em Jesus, não revogou seu sim para “salvar o que estava perdido” e “ dar sua vida em favor de muitos” (Mc 10, 45; Mt 20,28) Assim é o amor de Deus. Isto nada tem a haver com transferência de culpa da humanidade para recair sobre o Filho e aplacar a ira de Deus, fazendo-lhe justiça. Este foi Jesus, o Servo de Deus. Assim, ele nos “serviu” (nos salvou) e bebeu o cálice (sofrimento, solidão, dor da recusa) até o fim.  Devia Jesus ser fiel, mesmo que isto lhe custasse a vida. Mas, o acento aqui não recai sobre o sofrimento, a cruz, a morte, mas, sobre sua fidelidade. Por ter sido vitimado, o que o vitimou participou do que foi revertido por Deus em salvação. Assim, neste contexto, podemos entender o lugar da morte e da cruz na obra da salvação (Mt 8,31; Lc 17,25; Lc 22,37) Fora disso, não faz sentido. Pois, Deus nunca planejou a morte de seu Filho. Ele deseja “a misericórdia e não o sacrifício” (Mt 12,7). Avesso ele é a qualquer sacrifício humano. Isto desde o Antigo Testamento (Lv 18,21; 20,2-5; Dt 12,31; 18,10; Jr 7,30s; 20,26 ). Não foi para assinar o Filho no mundo que o Pai o enviou, mas “ para que o mundo seja salva por ele” (Jo 3,17).

Não é justo atribuir a Deus uma injustiça humana cometida contra Jesus; pois,  Jesus era inocente de sua morte, pois “passou pela vida fazendo o bem”- ) Não era vontade de Deus ver o Filho crucificado e de forma tão cruel.  Enviando-o ao mundo, uma natureza humana como a nossa o Pai lhe deu, para que, “sem renunciar a sua condição divina” (Fl 2,6), vivesse em tudo como nós e tendo vivido na carne o que vivemos, ele “é capaz de se compadecer de nossa fraqueza” (He 4,15), pois, assim como Pai, com que ele “é um só” (Jo 17,22) ele “ conhece a nossa estrutura e se lembra do pó que somos nós” (Sl 102/103, 14) Enfim, “entrando no mundo, diz: Sacrifício e oferta não quiseste, mas um corpo me preparaste” (He 10,5). Desejou Jesus e assim o fez, que o seu amor por toda a humanidade chegasse a todos mediante sua doação ao Pai (“dado por vós, para a remissão dos pecados”- Lc 22,19). O corpo dado, uma vida inteira, via pela qual Deus entrou no mundo de forma plena e nunca  como antes acontecida, prolongamento e consequência de sua Encarnação.

 

11 de março de 2012
servos da terra

12 (2)

Nosso Modo de Ser

Pe. Airton Freire

(Livro “Escritos da Terra, Vade Mecum)

Considerando o seguimento a Cristo como o que nos caracteriza, com simplicidade de vida, dirijo-me a ti, pessoalmente, para fazer-te as seguintes exortações:

Tu precisas santificar o santo nome que em ti há.

Tu precisas de um tempo de silêncio, em oração.

Tu precisas do sacramento da reconciliação.

Ao menos, semanalmente, hás que participar do santo sacrifício da celebração.

Tu precisas ter uma vida pessoal e sacramental condizentes com teu estado de vida, para ser recomposta a unidade perdida.

Unidade entre coração e mente há de existir em ti, o que te dará equilíbrio em teu modo de agir

Tens,  pois, como primeiro ponto: recompor a tua unidade interna.

Tu és pertença do Senhor e as áreas tuas que são marcadas pelo pecado precisam ser transformadas, como condição de que tu vivas a Verdade plena que por ti se consagrou. “Que eles sejam um como nós somos um” (Jo 17, 22). Este é o segundo ponto.

A unidade que precisa haver entre nós, enquanto Grupos da Terra, é o terceiro ponto a ser observado.

Tua práxis se dará, no mundo, pelo anúncio, diálogo, testemunho e serviço.

Servir para anunciar; anunciar para servir. Entre ambos, localiza-se o diálogo (διαλογος) com a Palavra e com o mundo e somente desta forma, poderemos testemunhar (μαρτυρειν ). Unidade interna e externa, volto, outra vez, a enfatizar.

Em qualquer que seja a obra nossa, nós deveremos revelar a Face Misericordiosa de Deus. Nós somos servos da Misericórdia, irmãos da Santa Esperança.

Tu és construtor da esperança. O mundo precisa de testemunho na ordem do que tu podes fazer. Que o mundo possa ver as razões da tua alegria e da tua esperança. Alimenta a esperança, foge da ilusão.

Imprescindível é que hás de, primeiramente ser, depois, testemunhar.

O mundo precisa perceber em ti um ser integrado. Que a Face misericordiosa possa em ti ser revelada.

Na unidade tu estarás por inteiro, não dividido, e a Face tornar-se-á refletida em ti e em teu derredor.

Que tenhas consciência, então, que teus atos favorecerão ou desfavorecerão toda a tua consagração à verdade.

Atos com a Verdade não condizentes serão motivos de grandes sofrimentos para ti pessoalmente e para todo o corpo do qual, sacramentalmente, és pertencente (cf. Cl 3, 3-4).

O amor efetivado é o amor que permanece em atos.

A tua credibilidade está em que teus atos revelem o amor que tu dizes ter ao Ser amado.

Sê tu o vigia do espaço de tua maior sacralidade.

Algumas podagens poderás, ao longo das estações, ter que suportar, mas o fruto valerá a pena a pena que há em esperar.

Hás que está disponível para alcançar.

Será esta tua primeira missão, que é missão de amor: viver a verdade plena, aquela que por ti se consagrou (“e, por eles, a mim mesmo me santifico, para que sejam santificados na verdade”, disse o Senhor – cf. Jo 17, 19).

E se, um dia, alguém lhes perguntar qual a sua espiritualidade, qual o seu carisma, qual a sua missão?

Tu vais dizer: a minha espiritualidade é aquela que brota do lado esquerdo de Cristo Jesus; é aquela que dá testemunho pela água, pelo sangue e pelo Espírito (cf. I Jo 5, 8). Os três dão testemunho da Verdade, que é o Senhor Jesus. Nós somos servos da misericórdia, dispersadores da misericórdia de Deus, por um estilo de vida, por um modo de ser, vivendo em comunhão com o Pai e Filho, no Espírito, na Igreja Unam, Sanctam, Catholicam et Apostolicam que o Senhor fundou.

No mundo estamos para darmos testemunho da Verdade, que é Cristo Jesus (cf. Jo 14, 6), em diversos estados de vida religioso, leigo e consagrado, todos vivendo o mesmo de, seguindo o modelo e a vontade do Senhor, buscarmos a santificação pela Verdade (cf. Jo 17, 17). Em razão disso, em qualquer situação, permaneceremos em seu amor (cf. I Jo 4, 16) pautando nossa conduta pela ética da alteridade.

Em Fevereiro de 2009.


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